Os exemplos aqui descritos têm o intuito de examinar as negociações ocorridas à luz dos conceitos de negociação ressaltados no livro "Negociação e Solução de Conflitos". Os casos analisados foram retirados de artigos e trabalhos estudados durante o processo de elaboração do livro. As percepções e análises foram baseadas apenas nas informações que foram veiculadas pela imprensa.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

J. Walter Thompson Publicidade — Caso Lux Luxo

Exemplo 1
Este exemplo foi extraído de uma das negociações realizadas pela empresa de publicidade J. Walter Thompson com seus clientes. A empresa, atuando no Brasil desde 1929, possui departamento de criação, mídia, planejamento, pesquisa e desenvolvimento, atendimento, entre outros.
A empresa ressalta a importância dos conceitos de negociação, inclusive pelo fato de atuar num ramo em que a parceria, a habilidade, o estilo, a ética e uma boa finalização das negociações são essenciais, dirimindo possíveis conflitos sem utilizar subterfúgios e truques que denigram o relacionamento cliente-agência, de forma que o ápice da negociação seja alcançado, isto é, um acordo ganha-ganha.
A negociação analisada deu-se com a Gessy Lever, produtora do sabonete Lux Luxo e Lux Suave (desde a década de 60); envolvia valor monetário de uma campanha a ser desenvolvida pela agencia, já que em 1986 a Gessy Lever perdia participação de mercado nesse segmento.
A perda era devida ao surgimento de novas opções do mesmo produto (sabonete), a perda da imagem do produto de alta qualidade, e também ao fato de ter ocorrido mudança no comportamento feminino a partir de 1970, passando este da concepção de se tornar uma estrela de cinema para tornar-se uma mulher dinâmica do dia-a-dia, trabalhadora e lutadora por seu espaço. Então, anteriormente, a estratégia utilizada pela Gessy Lever era a de atrair as mulheres que queriam consumir o sabonete das grandes estrelas de Hollywood; com a mudança de comportamento, era necessário atrair as mulheres independentes, que saíam de casa para trabalhar, ajudando a construir o mundo igualitário.
A partir de então, a agencia de publicidade propôs uma solução criativa de elaborar uma alta e inédita qualidade de produção, que iria custar a Gessy Lever US$ 1,2 milhão.
Dado que a empresa se dispunha a pagar apenas US$ 400 mil, inicia-se o impasse e o surgimento de um conflito.
O projeto ficou parado na área de marketing, embora a empresa quisesse aperfeiçoar sua qualidade. A área de marketing não tinha como levar em frente um projeto que ultrapassava três vezes seu orçamento previsto.
A agência de publicidade envolveu o diretor de atendimento, um nível hierárquico acima do qual se costuma trabalhar nos casos de orçamento, dada a existência do impasse e a importância do fechamento do acordo para a J. Walter Thompson.
O responsável pela agencia começou a buscar outros canais de comunicação, procurando explicar ao diretor de marketing que o projeto era ambicioso e invariavelmente precisaria de um investimento adicional, ou seja, a agencia buscou o maior número possível de alternativas para o acordo, além de fornecer informações mais detalhadas sobre o trabalho a ser desenvolvido, visando facilitar para a empresa decidir a favor do desenvolvimento do projeto.
As técnicas utilizadas propiciavam que o conflito fosse gerenciado de forma positiva, sem que as posições fossem consideradas, e que os interesses fossem satisfeitos. A ação para lidar com o conflito foi a que empurrou a solução, visto que o responsável da agenda, assumindo sua autoridade dentro da hierarquia da empresa buscou novas idéias e definiu ações que iam ao encontro dos objetivos estabelecidos. O conflito litigioso, conforme proposto por Sparks (1992:102), que permite solução ganha-ganha, pode ser considerado característica dessa negociação, pois o ponto negociado era de alta importância para todos os envolvidos.
Vale lembrar que a solução desse conflito litigioso foi imperativa, pois não houve tentativas de dominação, nem mesmo barganha de posições; em vez disso, buscou-se uma solução que atendesse completamente aos interesses das partes. Foi utilizada também a mediação para a solução do conflito. No caso, o diretor de atendimento, que, mesmo não sendo imparcial no processo de negociação, foi imprescindível para que novas visões fossem agregadas à solução do impasse, ajudando a buscar o melhor caminho para o acordo.
Nesse contexto, o estilo característico que permitiu melhor lidar com o conflito foi o colaborativo, estilo que é, ao mesmo tempo, confrontador e cooperativo, apropriado para buscar solução na qual os interesses dos envolvidos são muito importantes.
Sob a ótica do modelo de Jung, o estilo utilizado por esses negociadores foi mistura do amigável, visto que houve cooperação das partes na busca do melhor acordo, com o objetivo de manter um bom relacionamento, vislumbrando oportunidades futuras de trabalho, com algumas características do estilo confrontador, no qual a confiança e o controle se combinam para buscar a equidade de um acordo sólido para solucionar altos interesses envolvidos.
E na classificação de Gottschalk (1974), o estilo utilizado pode ser caracterizado como caloroso, o qual favorece a colaboração, a compreensão, o conhecimento das necessidades e os interesses dos negociadores, ávidos por respostas positivas às negociações, solucionando da melhor maneira possível eventuais conflitos que possam existir.
Assim, o diretor de marketing da Gessy Lever, após conversa com a agências de publicidade para buscar mais informações, fez uma proposta: queria negociar com a produtora a possibilidade de o pagamento ser parcelado em quatro vezes e propôs que a agência abrisse mão de seus honorários, já que recebia 15% sobre o montante pago à produtora.
O critério que o diretor de marketing usou para persuadir a agência a aceitar a proposta foi a questão da repercussão; caso esta fosse boa, geraria mais negócios para a agência. Nesse caso, o diretor soube utilizar sua capacidade persuasiva. Foi estipulado, então, um prazo de 24 horas para que a agenda apresentasse uma resposta. Terminado o prazo, a agência tinha uma contraproposta: o custo da produção seria parcelado, só que em dólar, para não haver perda do valor. Além disso, a mesma se disporia a não receber os honorários sobre a produção, mas queria maior investimento em mídia (a agencia recebe 20% sobre o valor destinado a mídia).
O resultado do acordo foi a marca reconquistar a liderança de mercado e a agência sair fortalecida, pois a campanha teve muito sucesso e repercussão. Ou seja, consumou-se um acordo ganha-ganha.
A partir de então, é possível detectar a busca do melhor meio de se comunicar com o cliente e fazê-lo aceitar o projeto elaborado. A presença nas negociações de um contato de nível superior na hierarquia da agência, algo incomum no processo normal de conversação, define a importância dada pela agência ao cliente. Isto sinalizava à Gessy Lever a necessidade de contar com a agência de publicidade para realizar a campanha, podendo utilizar este poder de maneira a conseguir o acordo que desejava. É importante ressaltar, entretanto, que esse poder não necessariamente precisa ser usado para prejudicar o oponente, no caso, a agência; o cliente tem o poder de conhecer as necessidades da agência e sabe ponderá-lo para conseguir melhor acordo para todas as partes.
Outro aspecto importante está relacionado com a reunião realizada entre cliente e agência. O contato permitiu major integração entre os negociadores, além de proporcionar uma busca de informações requisitadas pelo cliente, tanto a respeito do que seria desenvolvido na campanha, quanto na confirmação do cumprimento ou não do acordo a ser firmado pelos interessados. Ambos souberam ouvir, discutir e armazenar as informações para negociar um acordo melhor.
O tempo também aparece, no caso, como fator imprescindível para a solução da negociação. Vê-se que a agência tem apenas 24 horas para aceitar ou não e fazer uma contraproposta. De certa forma, o pouco tempo pode ter influenciado a decisão da agência (de não receber honorários, por exemplo), sendo que, se dispusesse de um pouco mais de tempo, analisaria melhor a proposta do cliente, podendo ter outra solução.
Entretanto, o acordo foi firmado com satisfação das partes envolvidas: o cliente satisfeito com a recuperação da liderança do produto no mercado e a agência fortificada com o sucesso da campanha. Acima de tudo, permaneceu a possibilidade de futuros contatos para novos negócios, novas negociações, novos projetos, além da possibilidade de os acordos serem como este, ou seja, ganha-ganha.
A questão da ética, tão considerada pela empresa, deve-se principalmente ao fato de ser uma multinacional, tendo seus padrões de trabalho extremamente rigorosos determinados no exterior; há cobrança de maximização dos resultados dessas negociações e de lucro, como conseqüência. Isto pode ser visto na empresa, por meio da implementação de cursos voltados para a solução de situações conflitantes e impasses, baseados em The Thompson way, sistema de perguntas que busca localizar o cliente no negócio (planejamento, estratégia e brieffing).